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Lula preso podia falar; Bolsonaro, não


Ney Lopes

No direito há um conceito da maior importância: a equidade. De uma maneira simples, nada mais é do que dar às pessoas o que elas precisam para que todos tenham acesso às mesmas oportunidades e direitos. Em 2019, o ex-presidente Lula estava preso em Curitiba, após ser condenado em segunda instância pelo TRF-4 (Tribunal Regional da 4ª Região) a 12 anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá (SP).

Os jornalistas Florestan Fernandes Júnior, do EL PAÍS, e Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo o entrevistaram, após autorização do ministro do STF Ricardo Lewandowski, que citou inúmeros precedentes, garantindo o direito de pessoas custodiadas pelo Estado, nacionais ou estrangeiros, falarem com a imprensa, e que “não raro, diversos meios de comunicação entrevistam presos por todo o país, sem que isso acarrete problemas maiores ao sistema carcerário”. Para o ministro, não é “crível” que a realização de uma entrevista com Lula “ofereça maior risco à segurança do sistema penitenciário do que aquelas já citadas, concedidas por condenados por crimes de tráfico, homicídio ou criminosos internacionais”.

Depois, Lula concedeu duas horas de entrevista e antes de começar fez um pronunciamento à nação. Declarou, que desde o início do processo o objetivo era “chegar em mim”. Defendeu-se.

Em agosto de 2026, o ministro Alexandre Moraes decreta a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, um dia depois do mesmo aparecer em vídeo publicado pelo seu filho Flávio nas redes sociais, atendendo uma ligação telefônica, quando disse: ” “Boa tarde, Copacabana. Boa tarde, meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos”, disse o ex-presidente.

Na hipótese da prisão decretada, a simples publicação de Flávio Bolsonaro dessa “saudação “não significaria descumprimento das cautelares, salvo se restasse comprovado que o ex-presidente postou o vídeo por meio das redes sociais do filho, com objetivo de ampla divulgação. Isso não ocorreu.

Pelo visto, a equidade foi eliminada e desconhecida. Concedeu-se o direito de Lula falar, mesmo preso e condenado. Negou-se esse direito a Bolsonaro, antes de estar decretada a sua prisão. Como decifrar essa charada?

O risco da esquerda manter-se no poder

Neste contexto foram raras as vezes que os Estados Unidos interferiram tão profundamente em um país latino-americano. O tarifaço de 50% sobre importação de produtos brasileiros pelos Estados Unidos, entrou em vigor, atingindo 906 municípios, que têm relações comerciais com os americanos e não escaparam da tarifa adicional imposta por Trump. O volume de comércio entre os dois países era altamente satisfatório. Em 2024, atingiu US$ 92 bilhões. Em termos econômicos, não havia razão para punir o Brasil.

O levantamento feito pelo Estadão leva em conta os 30 produtos mais exportados pelo Brasil aos Estados Unidos em 2024 e os segmentos que foram alvo da sobretaxa adicional de 40% decretada por Trump.

Da mesma forma que esta coluna sugeriu em 28 de julho último, a imprensa internacional (NYT e outros) manifestou a opinião de que “a rota mais limpa para a solução passa pelo próprio Bolsonaro: ele precisaria pedir diretamente a Trump que aliviasse ou retirasse as tarifas, provavelmente quando o lobby industrial se tornasse muito barulhento e os números de Lula nas pesquisas subissem além do conforto”.

A mídia internacional propõe o que já sugeri no artigo publicado em 28 de julho: se o objetivo de Trump é ajudar Bolsonaro ao impor o tarifaço ao Brasil, seria necessário que Bolsonaro o ajudasse numa solução e evitasse que a pretendida ajuda se transforme em mais uma dificuldade. Para isto, Bolsonaro teria que tomar uma atitude, que deixasse clara a sua posição neste episódio. A atitude seria, dirigir-se a Trump, seu amigo, e fazer veemente apelo para a suspensão imediata do tarifaço, concedido prazo de 90 dias para negociação

Na hipótese desse “gesto” não ocorrer, o quadro se complica e aconteça o que acontecer em 2026, Bolsonaro não terá ninguém para culpar, além de si mesmo e seus adeptos radicais. Inevitavelmente, as consequências políticas oferecerão a Lula a oportunidade de posicionar-se em favor da soberania e do nacionalismo, ao mesmo tempo em que se aproxima do BRIC. Poderá ocorrer um consenso político interno contra os Estados Unidos, em resposta ao unilateralismo de Trump. Para o futuro do Brasil será um desastre, abrindo chance da esquerda manter-se no poder, até com posição mais radical do que atualmente.

 * Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente da CCJ da Câmara Federal – ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – nl@neylopes.com.br – blogdoneylopes.com.br

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