Editorial - O novo PNE e a perpetuação do atraso na educação

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Editorial - O novo PNE e a perpetuação do atraso na educação

Tabata Amaral, Hugo Motta, Camilo Santana e Moses Rodrigues na apresentação do parecer do relator ao novo Plano Nacional de Educação. (Foto: Reprodução/YouTube/Câmara)

Porto Velho, RO - O Senado Federal tem em mãos o poder de decidir se o Brasil finalmente rompe com a mediocridade educacional ou se mergulha em pelo menos mais uma década de estagnação. A análise do novo Plano Nacional de Educação (PNE) para o decênio 2025–2035 acontece em um momento crítico: enquanto o texto tramita, a realidade das salas de aula mostra o quão urgente é tratar a educação como prioridade, mas o projeto do PNE prefere ignorar a triste realidade da educação brasileira para abraçar uma agenda essencialmente ideológica.

A crônica deficiência na qualidade da formação dos brasileiros não é apenas uma percepção, mas um dado estatístico implacável. O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) revela que somos um país de analfabetos funcionais: 29% da população brasileira entre 15 e 64 anos é incapaz de compreender textos densos ou resolver problemas matemáticos simples. Desse total, 7% são analfabetos absolutos, para quem letras e palavras nada dizem.

O Senado não pode ser conivente com um plano que prioriza a retórica identitária em vez dos resultados. Se o Congresso aprovar o PNE do jeito que está, sem alterações profundas, estará condenando o país a mais dez anos de atraso social e econômico – algo que o país conhece bem

O mais grave é que essa situação permanece praticamente inalterada desde 2002, evidenciando que as políticas das últimas duas décadas falharam miseravelmente em elevar o patamar da educação nacional. Ano após ano, o Brasil amarga posições vergonhosas em rankings internacionais, figurando entre os piores do mundo em matemática e linguagem, por exemplo.

Mas, em vez de atacar esse abismo com rigor técnico, única resposta plausível diante da situação crítica, o novo PNE apresenta-se como uma “lista de desejos” de grupos sindicais e partidários, deixando para segundo plano a educação em si. O texto abandona o compromisso com a eficácia do ensino ao suprimir referências ao uso de “evidências científicas” na formulação de políticas, substituindo-as por termos vagos como “promoção da equidade”. O foco na alfabetização e no domínio da língua portuguesa, algo elementar em qualquer planejamento educacional, é diluído em favor de uma visão de “linguagem enquanto inclusão”, em detrimento da linguagem como base da identidade nacional e do raciocínio lógico.

Outro problema é a insistência no identitarismo, que ameaça até a universalidade do direito à educação. Ao priorizar recursos e políticas para grupos específicos – como quilombolas, indígenas e populações das águas –, o Estado corre o risco de praticar uma nova forma de exclusão. Crianças brancas ou pardas em situação de extrema vulnerabilidade nas periferias urbanas podem ser negligenciadas simplesmente por não se encaixarem nessas categorias ideológicas. Além disso, a inserção de “temas transversais”, como pautas ambientais e de direitos humanos, já na educação infantil, etapa fundamental na aprendizagem, pode prejudicar o trabalho com conteúdos essenciais para o desenvolvimento cognitivo da criança.

A proposta do PNE é ainda mais temerária ao sugerir um aumento de gastos para até 11% do PIB sem estabelecer qualquer mecanismo de responsabilização ou metas de desempenho. Gastar mais sem critérios de eficácia é apenas desperdício de dinheiro público. Não basta investir mais; é preciso planejar bem onde os recursos são aplicados e cobrar resultados. Mas, no Brasil, o modelo que se consolidou – e que a aprovação do novo PNE pode manter por pelo menos mais 10 anos – é o de exigir cada vez menos de alunos e professores, desestimulando a busca por excelência.

Um exemplo que ilustra esse modelo de “baixa exigência” é a institucionalização da aprovação automática, como visto recentemente no Rio de Janeiro, onde alunos podem avançar de série mesmo sendo reprovados em até seis disciplinas. Trata-se de uma “inflação educacional” que mascara a ignorância e desmotiva professores e alunos.

O Senado não pode ser conivente com um plano que prioriza a retórica identitária em vez dos resultados. Se o Congresso aprovar o PNE do jeito que está, sem alterações profundas, estará condenando o país a mais dez anos de atraso social e econômico – algo que o país conhece bem. É dever dos parlamentares exigir um plano baseado em metas concretas, avaliações rigorosas de desempenho e no compromisso inegociável com o aprendizado, especialmente o de português e matemática. O Brasil não pode mais esperar para ser a “nação do futuro”; o futuro exige que aprendamos, o quanto antes e finalmente, a ler, escrever e pensar.

Fonte: Por Gazeta do Povo

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