Colapso anunciado: dívidas com pessoas e empresas vão encurralar governo após a eleição

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Colapso anunciado: dívidas com pessoas e empresas vão encurralar governo após a eleição

Lula pode ser o último presidente a conseguir pagar precatórios fora do limite de gastos. (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Porto Velho, RO
- Os precatórios prometem se tornar o grande inconveniente da próxima gestão federal, independentemente do presidente eleito. De acordo com projeções que integram o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do ano que vem, já em 2027 – primeiro ano do próximo governo – faltará dinheiro para bancar despesas não obrigatórias. E o cenário se agravaria em 2028 e 2029.

Em grande parte, a limitação se deve à reinclusão, no limite de gastos do arcabouço fiscal, dos precatórios – originários de decisões do Poder Judiciário que determinam o pagamento de dívidas dos governos federal, estaduais e municipais.

De acordo com estimativas do PLDO, divulgado na terça-feira (15), para 2027 está previsto o pagamento de R$ 124,3 bilhões em precatórios, fazendo com que o montante destinado às despesas discricionárias (de livre manejo) do governo caia de R$ 208,3 bilhões em 2026 para R$ 122,3 bilhões – uma diferença de R$ 86,1 bilhões.

Desse total estimado para as despesas não obrigatórias em 2027, o Executivo ainda terá que descontar R$ 56,5 bilhões que devem ser destinados às emendas parlamentares, restando R$ 65,7 bilhões. As avaliações são de que o governo precisa de, pelo menos, R$ 70 bilhões para não parar. Isso porque gastos de custeio, que mantêm a máquina "funcionando", são considerados não obrigatórios.

Para 2028 e 2029, as projeções são ainda mais críticas, com esperados R$ 132 bilhões e R$ 144 bilhões em precatórios, respectivamente. Nesses anos, o valor para as despesas discricionárias cairia para R$ 59,5 bilhões e R$ 8,9 bilhões, inviabilizando ainda mais o funcionamento da máquina pública.

Em coletiva sobre o PLDO, o secretário de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Clayton Montes, afirmou que, em 2027, “o número é bastante comprometedor". "Já comprometeria a realização de políticas públicas", afirmou ele, reiterando que "o valor não comporta todas as necessidades do Poder Executivo."

O secretário também afirmou que o governo trabalha com os dados existentes no momento e que, por isso, não há que se classificar as previsões orçamentárias de "peça de ficção". “É uma projeção que dá condição de ter esse tipo de discussão, inclusive, da necessidade de tomar medidas neste momento para que, lá em 2027, a gente alcance um patamar razoável de manutenção das despesas discricionárias”, afirmou.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet, disse que o governo terá que colocar cerca de R$ 50 bilhões em precatórios no orçamento em 2027. Para tanto, ela vislumbra que será necessário fazer “ajustes fiscais mais robustos", segundo afirmou ao programa Bom Dia, Ministro, da rede EBC.

No entanto, a ministra empurrou para adiante o momento desses ajustes. Segundo ela, só ocorrerão depois das eleições de 2026, quando o governo precisará “enfrentar essas questões e colocar dinheiro nos cofres públicos, para fazer políticas necessárias ou rediscutir os parâmetros do arcabouço [fiscal]”.

Em declarações recentes sobre o PLDO deste ano e suas projeções, o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP) avaliou que se trata de uma “peça de ficção orçamentária”.

“​​Ignora os gatilhos fiscais, empurra o rombo para 2027 e tenta maquiar uma crise fiscal iminente. O governo joga para debaixo do tapete a realidade das contas públicas e transfere a bomba para o próximo mandato. Isso não é responsabilidade fiscal, é má gestão disfarçada de otimismo”, disse o deputado à Gazeta do Povo na quarta-feira (23).

PECs dos Precatórios, do governo Bolsonaro, adiou impacto mais significativo


O impacto dos precatórios nas contas públicas já é antigo. O ministro da Economia de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes, chegou a chamá-los de “meteoro”. A afirmação veio em razão do montante que o Supremo Tribunal Federal e demais Cortes brasileiras haviam estipulado para 2022: R$ 89,1 bilhões, valor 60% acima do previsto para 2021.

Em dezembro de 2021, o Congresso Nacional aprovou duas PECs dos precatórios, que se tornaram as Emendas Constitucionais 113 e 114. Elas determinaram limites anuais no orçamento para o pagamento dessas dívidas e, além disso, mantiveram os valores acima desse limite fora do teto de gastos – ou seja, do limite de despesas do governo até 2026.

Desse modo, ainda que o governo tenha que pagar um determinado volume de precatórios, somente uma parte desses valores tem entrado no cálculo das despesas primárias e do limite de gastos. Por exemplo: em 2024, não fosse esse mecanismo, ao déficit de R$ 11,03 bilhões do governo, somar-se-iam os R$ 73,14 bilhões pagos em precatórios, resultando em um déficit total de R$ 84,17 bilhões.

Considerados os precatórios, o total seria mais que o triplo do déficit máximo estipulado pela meta do arcabouço fiscal para o ano passado, de R$ 27,7 bilhões. Ou seja, se os precatórios fossem contabilizados no resultado do governo, a meta fiscal não teria sido cumprida e o limite de gastos teria sido extrapolado.

Decisão do STF impede novas exceções e créditos extraordinários para pagamentos de precatórios


Em 2023, no julgamento da ADI 7064, o STF avaliou a constitucionalidade de diversos pontos das Emendas Constitucionais 113 e 114. Em sua decisão, o Supremo permitiu que o Poder Executivo abrisse crédito extraordinário nos exercícios de 2023 (pagando os precatórios atrasados de 2022, os de 2023 e adiantando os de 2024), 2025 e 2026 fora de todas as regras fiscais (tanto da meta de resultado primário quanto da regra de limite de despesas).

Esse crédito extraordinário foi coberto por emissão de dívida pública. E o pagamento acumulado dos precatórios acabou sendo um dos fatores determinantes para o crescimento econômico acima do esperado em 2023 e 2024, segundo economistas.

No entanto, conforme explica o diretor da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, Graciano Ramos, a partir de 2026 – limite estabelecido pelo Supremo para o pagamento fora das regras – o governo não poderá mais rolar esse excedente por anos, “na forma de um calote legalizado”, e usar o espaço para outras despesas.

Eduardo Jacomo Seraphim Nogueira, consultor de orçamentos da Instituição Fiscal Independente (IFI), afirma que, caso não haja outra modificação legal ou nova decisão judicial, os precatórios voltarão a afetar o cálculo do resultado primário e da regra de limite de despesas a partir de 2027.

Na visão do consultor, é pouco provável que haja nova rolagem dos precatórios, tendo em vista que o STF declarou, nesse mesmo julgamento, que o estabelecimento de restrições ao pagamento (teto de precatórios) é incompatível com a Constituição.

Executivo não aproveitou espaço fiscal dos precatórios


Jacomo afirma que a decisão do STF foi avaliada como controversa por alguns especialistas, já que o STF reconheceu como urgente e relevante, ainda em 1.º de dezembro de 2023, o pagamento de precatórios que deveriam ser quitados em orçamentos que seriam elaborados, discutidos e aprovados um ou dois anos depois do julgamento (no caso, os de 2025 e 2026).

Em tese, a medida deveria ter criado condições para que o Poder Executivo gerasse espaço fiscal necessário para a volta do pagamento integral de precatórios dentro das regras fiscais a partir de 2027.

“Ocorre que o Poder Executivo preencheu o espaço fiscal, criado artificialmente pela decisão do STF, com outras despesas que também cresceram ou foram criadas no período", afirma o consultor da IFI.

Ele avalia que a questão demandará que o governo proponha alguma solução já em abril de 2026. Esse é o prazo para o envio do PLDO de 2027, já tendo em vista que o limite de despesas daquele ano não deve suportar a volta do pagamento integral dos precatórios, afirmou Jacomo.

Para IFI, nova regra legislativa seria solução plausível para precatórios

O consultor da IFI avalia que, diante da impossibilidade de nova prorrogação desses pagamentos, uma solução possível seria reclassificar os gastos com precatórios, tirando-os da rubrica de despesa primária e transformando-os em despesa financeira. No entanto, a tentativa já foi feita no julgamento da ADI e não teve êxito no STF.

A alternativa seria buscar essa alteração via proposta legislativa. De acordo com Jacomo, a apresentação de um projeto de lei complementar seria a forma de excluir precatórios da meta, já que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) impede a retirada de despesas primárias da apuração da meta de resultado primário dos orçamentos fiscal e da seguridade social.

Ele afirma que, a fim de excluir todo o valor de precatórios do limite de despesas do arcabouço fiscal, seria necessário alterar dois trechos da legislação:

o parágrafo 7.º do artigo 4.º da LRF; e

o inciso VI do parágrafo 2.º do artigo 3.º da Lei Complementar 200/2023

Atualmente, apenas estão excluídos os precatórios de grande valor e os que excedem o limite previsto para o pagamento dessas dívidas.

A dúvida dos especialistas é se o governo buscará resolver antes das eleições presidenciais de 2026 esse problema anunciado, mas que só terá impacto efetivo sobre as contas públicas no primeiro ano da próxima gestão.

Fonte: Por Roberta Ribeiro

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