
Igor Dias Delecrode, suspeito de criar o sistema que permitiu tirar dinheiro dos aposentados - Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado.
Porto Velho, RO - Apontado como criador do sistema que fraudou o INSS, com a cumplicidade de seus dirigentes, para roubar mais de 9 milhões de aposentados, Igor Dias Delecrode, 28 anos, sócio de empresas de tecnologia da informação envolvidas no esquema, não colaborou em nada: ele também foi blindado por habeas corpus preventivo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) desta vez Gilmar Mendes, e foi autorizado a não responder a qualquer pergunta.
O esquema que terá concebido e do qual se beneficiou é suspeito de haver retirado das aposentadorias quase R$1,5 bilhão, utilizando-se de brechas que teria criado ou identificado no sistema, desenvolverndoum programa para fraudar biometria e assinaturas digitais no INSS. Em menos de um ano, o depoente recebeu R$15 milhões acusado de. A ferramenta teria dado aparência de legalidade aos descontos feitos por meio de falsificações.
No entanto, Gilmar Mendes dispensou Igor Delacrode até mesmo de assumir compromisso de dizer a verdade, o que na prática o autorizava a mentir. Ele disse apenas que mora em São Paulo e é formado em auditoria financeira e, vagamente, que pratica atividades de tecnologia e informação como “hobby”.
Horas depois, percebendo estar diante do mentor do esquema, a CPMI decidiu apreender o celular de Delacrode. Mas seu advogado Levy Magno orientou seu cliente a não fornecer a senha de acesso ao aparelho e registrou seu “inconformismo” com a decisão. Pediu a devolução do aparelho, o que foi negado pelo presidente da comissão.
“Meteu a mão com força”
Delacrode se recusou a responder a todos os questionamentos. Somente o relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), tinha 90 perguntas a fazer, destacando que Delecrode “meteu a mão com força” em mais de R$1,460 bilhão nas fraudes com a cumplicidade ao menos de nove entidades.
— Ele virou multimilionário, transacionou mais de R$15 milhões em menos de um ano com invenção de ferramentas para tirar dinheiro de aposentados e pensionistas. Impunidade, riqueza e tapa na cara do brasileiro. Tem hora que revolta. O que a gente está fazendo aqui? É dinheiro roubado do povo brasileiro e não acontece absolutamente nada. Esse silêncio é a vitória da impunidade. No Brasil, compensa praticar crimes — afirmou Alfredo Gaspar.
O relator destacou que Delecrode montou uma organização criminosa que atuou em pelo menos três núcleos criminosos. O trabalho contou com um sofisticado sistema de coleta de dados e verificação de autenticidade, que burlou o sistema de biometria facial a partir da cópia da identidade, em esquema descoberto pela Controladoria-Geral da União (CGU).
— Ele conseguiu uma mágica maior, é o coração tecnológico da safadeza. Juntando tudo que ele participou, obteve mais de R$ 1,4 bilhão. Se o Brasil fosse sério, esse elemento estaria preso. Criou um conglomerado tecnológico, cada associação tinha um sistema de verificação de identidade independente —acusou o deputado.
O relator apontou que, além do STF, alguns membros da própria CPMI estariam blindando a convocação de depoentes, o que impediria o aprofundamento das investigações.
— O silêncio do depoente é um tapa na cara do povo brasileiro. Ele conseguiu justiça que o brasileiro comum não consegue. O STF está transformando a justiça brasileira em dois degraus, o dos pobres e o dos endinheirados. Deveria estar preso quem autorizou solução provisória no INSS, quem compactuou com essas entidades, todos esses presidentes de associação. E tem gente sendo blindada aqui [na comissão mista] não é só no STF, não, e isso é vergonhoso.
CPMI protesta contra Gilmar
Para o presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), a concessão de habeas corpus pelo STF ao depoente indica que o trabalho dos parlamentares “não vale absolutamente nada”.
— Isso é para nos fazer pensar o tanto que nós precisamos retomar atribuição do Congresso Nacional que, infelizmente, tem sido entregue a outro Poder, por covardia ou conivência, seja o que for. Este Senado precisa ter coragem para se levantar, dar resposta dentro da Constituição, novos limites de pesos e contrapesos nessa convivência entre os Poderes. Isso não pode continuar, precisamos retomar coragem, toda concentração excessiva de poder não faz bem à democracia — defendeu.
O senador Rogério Marinho (PL-RN) apontou a existência de uma “jurisprudência de exceções, uma disfuncionalidade de funcionamento dos Poderes”.
O senador Izalci Lucas (PL-DF), por sua vez, defendeu que a CPMI se reúna com o ministro André Mendonça e peça ao STF a prisão preventiva dos envolvidos no esquema ilegal contra os aposentados.
No início da reunião, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) anunciou que o prazo para pensionistas lesados pedirem ressarcimento foi prorrogado de 14 de novembro de 2025 até 14 de fevereiro de 2026. Até o presente momento, mais de 3 milhões de aposentados receberam devolução, que totaliza mais de R$ 2 bilhões.
“Nós te pegamos”, avisa Damares
Para a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), os órgãos públicos precisam passar por uma reforma administrativa para ter mais competência na fiscalização. Damares disse ter a impressão de que o depoente “é às vezes muito inteligente e às vezes muito burro”, mas que de qualquer forma ele estaria em “uma grande enrascada”.
— Não pense que você é esperto. Nós te pegamos. Sua situação é gravíssima — afirmou a senadora a Igor Delecrode.
Segundo a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), a CPMI tem trabalhado com “muita garra”. Ela disse ainda que “a pizzaria não será no Congresso Nacional”. Na visão de Soraya, o funcionamento das entidades associativas aponta para uma organização criminosa para fraudar o INSS.
— Eu calculo para o depoente em torno de 53 anos de prisão na pena máxima — registrou a senadora.
Silêncio da culpa, diz Viana
Carlos Viana afirmou que gostaria de poder colocar o depoente na cadeia, mas lembrou que precisava seguir a lei. Ele lamentou o fato de o Brasil ouvir mais uma vez “o silêncio da culpa”. Segundo o senador, os brasileiros viram na CPMI o espelho de um país ferido pela corrupção. Viana também disse que os órgãos públicos fizeram um silêncio cúmplice diante do esquema de fraude do INSS.
— Transformaram o benefício dos aposentados em objetos de luxo e ostentação. Enquanto o governo sorri diante das câmeras, os aposentados choram diante das contas. A verdade vai vencer o silêncio — registrou o presidente, que ainda reclamou dos habeas corpus concedidos pelos ministros do STF que garantem direito ao silêncio aos depoentes.
Celular
A comissão aprovou, por votação simbólica, a apreensão dos celulares de Igor Dias Delecrode, bem como o acesso a aplicativos de mensagens. O requerimento foi apresentado pelo relator, deputado Alfredo Gaspar. O depoente não resistiu e entregou o aparelho ao presidente Carlos Viana, que logo passou o celular à Polícia Legislativa.
No entanto, o advogado Levy Magno orientou seu cliente a não fornecer a senha de acesso ao aparelho e registrou seu “inconformismo” com a decisão. Segundo Magno, deveria haver uma decisão judicial para a apreensão. Ele ainda pediu a devolução do aparelho, o que foi negado pelo presidente da CPMI.
— É um iPhone 17, que foi comprado esta semana. Os outros já foram levados pela Polícia Civil e pela Federal — informou o depoente a Carlos Viana.
Fonte: DP Redação


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