Editorial - Grau de investimento, o sonho que o governo tornou impossível

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Editorial - Grau de investimento, o sonho que o governo tornou impossível

Shelly Shetty, chefe de classificação da Fitch para Américas e Ásia, durante evento no México, em junho de 2025. (Foto: José Méndez/EFE)

Porto Velho, RO -“Acredito realmente que nós temos a chance de completarmos o mandato do presidente Lula reobtendo o grau de investimento. Ele não está dado, mas é uma possibilidade concreta”, disse, no começo de outubro do ano passado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entusiasmado com a inexplicável decisão da agência de classificação de risco Moody’s de elevar a nota brasileira. Se é que Haddad ainda sonhava com isso quase um ano depois, outra agência, a Fitch, acabou com a esperança do governo na semana passada. “Não antecipamos o Brasil voltando a ganhar um grau de investimento tão cedo”, afirmou Shelly Shetty, chefe de ratings soberanos da Fitch para Américas e Ásia, em um evento da instituição realizado em São Paulo.

O grau de investimento, uma espécie de “selo de bom pagador”, é importante por sinalizar que uma determinada nação é mais segura para o capital estrangeiro – há instituições financeiras ou fundos de pensão que só investem em títulos de países que estiverem nesse patamar. O Brasil chegou a conquistá-lo durante o segundo mandato Lula, em meio à euforia com o pré-sal e outros bons indicadores econômicos, mas todas as três grandes agências de classificação de risco (além da Fitch e da Moody’s, faz parte desse trio a Standard & Poor’s) tiraram o grau de investimento do Brasil em 2015, quando o país amargava a recessão causada pela “Nova Matriz Econômica” lulodilmista. Shelly Shetty lembrou que países que perdem o grau de investimento costumam recuperá-lo em seis anos, em média, mas que o Brasil ainda está “longe disso”, mesmo tendo se passado já uma década.

Alguns dos indicadores atuais brasileiros, como o déficit e a dívida, ambos como proporção do PIB, estão piores hoje que quando o Brasil perdeu o grau de investimento

A avaliação da chefe da Fitch não surpreende, até porque alguns dos indicadores atuais brasileiros, como o déficit e a dívida, ambos como proporção do PIB, estão piores hoje que quando o Brasil perdeu o grau de investimento. Ela afirmou, ainda, que a política econômica brasileira tem “pouca credibilidade”, e se referiu especificamente ao arcabouço fiscal – ironicamente, também em outubro de 2024 Haddad havia afirmado que o grau de investimento viria “se defendermos a arquitetura do arcabouço”. Não adianta, aqui, argumentar que o governo e sua base aliada no Congresso vêm desmoralizando sua âncora fiscal ao retirar inúmeras despesas do cálculo da meta fiscal; ainda que nenhuma dessas acrobacias contábeis estivesse sendo feita, a própria “arquitetura do arcabouço” já joga contra o país ao prever aumento real do gasto público todo ano, independentemente do estado da economia, colocando o Brasil no caminho oposto ao necessário para recuperar o selo de bom pagador.

Justiça seja feita, Haddad havia imposto mais algumas condicionais em sua avaliação esperançosa: o grau de investimento viria “se o governo como um todo compreender que vale a pena esse esforço, que esse esforço que está sendo feito produz os melhores resultados e continuarmos sem baixar a guarda em relação às despesas, em relação às receitas, fazendo o nosso trabalho”. Nada disso, no entanto, foi feito. Pelo contrário: o governo continua a aumentar o gasto e a colocar a mão cada vez mais fundo no bolso do pagador de impostos como forma de fechar as contas – mas, apesar dos sucessivos recordes de arrecadação, o déficit não recua, a ponto de o governo já tratar o limite inferior da meta fiscal como o real objetivo a ser atingido.

Mesmo a Moody’s, que aparentemente caiu no conto do vigário de Lula e Haddad em uma reunião da dupla com o trio de agências em Nova York em setembro de 2024, percebeu o equívoco: depois de deixar a nota brasileira a apenas um nível do grau de investimento, com perspectiva positiva, a agência reviu sua avaliação em maio deste ano e, embora tenha mantido a nota do país, alterou a perspectiva para estável, ou seja, sem esperanças de elevação no futuro próximo. A julgar pela maneira irresponsável como o governo vem tratando a questão fiscal, a verdade é que o Brasil pode se dar por muito satisfeito ao se manter apenas um ou dois degraus abaixo do selo de bom pagador, pois a realidade não parece tão alvissareira.

Fonte: Por Gazeta do Povo

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